Apenas 0,03% dos semáforos para pedestres existentes na cidade de São Paulo possuem sinalizações sonoras para facilitar a travessia de deficientes visuais. É o que aponta o levantamento feito pelo Laramara (Associação Brasileira de Assistência à Pessoa com Deficiência Visual), que registra a existência de dois sinais sonoros na capital paulista que, de acordo com a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), possui 5.668 cruzamentos semaforizados.
Ambos os equipamentos estão instalados próximos à instituição: um deles na rua Conselheiro Brotero, na altura do número 338, na Barra Funda, região central da cidade; e outro no cruzamento da rua Conselheiro Brotero com a rua Brigadeiro Galvão, no mesmo bairro. Mas, conforme apurado pela reportagem do UOL, apenas o primeiro está funcionando integralmente.
Quando a reportagem passou pelo segundo semáforo sonoro –no fim de setembro–, que possui uma tecnologia mais avançada, com a emissão de mensagens sonoras para o deficiente visual, de acordo com a associação, não estava funcionando.
"Ocasionalmente eles dão uma pane", disse João Felippe, especialista de orientação e mobilidade da Laramara, que relatou ter dificuldades para pedir a manutenção dos equipamentos. "Sempre há um jogo de empurra-empurra."
A cidade, segundo Felippe, já chegou a ter outros três sinais sonoros, mas atualmente estão todos desativados [rua Vergueiro, em frente ao Centro Cultural São Paulo, no Paraíso; avenida Nazaré, próximo ao Instituto de Cegos Padre Chico, no Ipiranga; e rua Pensilvânia, em frente ao Centro de Apoio Pedagógico Especializado, no Brooklin].
Em nota, a CET informou que os testes com semáforos sonoros para deficientes visuais foram iniciados há cerca de sete anos na cidade de São Paulo, em parceria com uma empresa multinacional, que doou as botoeiras sonoras para os cruzamentos. "Os equipamentos de três endereços apresentaram problemas e, como estes semáforos funcionavam em caráter experimental, em parceria com a empresa, não foram renovados", apontou o comunicado.
Metrópoles mais acessíveis
Enquanto a cidade de São Paulo, com cerca de mais de 11,2 milhões de habitantes, possui dois sinais sonoros, a capital paranaense, com 1,7 milhão de habitantes e 830 cruzamentos com semáforos, tem sete cruzamentos que contam com o equipamento, sendo cinco deles nas proximidades da rua 15 de Novembro, no centro da cidade.
A desproporção é ainda maior quando se compara a situação paulistana com a realidade de Porto Alegre. A capital gaúcha, que tem 1,4 milhão de habitantes, tem 82 botoeiras sonoras que beneficiam os deficientes visuais na travessia de 28 cruzamentos. "A previsão é que até o final de 2014 a cidade tenha mais de 200 botoeiras espalhadas por todas as regiões", afirmou Raul Cohen, secretario Municipal de Acessibilidade e Inclusão Social. Segundo o especialista em mobilidade, Porto Alegre e Curitiba são consideradas capitais modelo no quesito acessibilidade para deficientes visuais.
Segundo ele, há um projeto na cidade que prevê a instalação desses equipamentos na rota chamada de "Caminho do Gol", ou seja, todos os pontos que haverá maior concentração de torcedores durante a Copa de 2014. "A secretaria também orienta a instalação das botoeiras sonoras em locais de maior fluxo de pedestres e em localizações específicas mediante a solicitação de moradores", contou Cohen.
Na opinião de Felippe, no entanto, o ideal era que todos os cruzamentos de uma cidade, principalmente os mais movimentados, tivessem a sonorização. "Se existe semáforo orientando o pedestre visualmente, neste local deveria ter sonorização para orientar o deficiente visual", relatou ele, que diz ser possível e passível a construção de metrópoles mais acessíveis. "Só que existe pouca vontade, pouco desejo e pouco empenho das autoridades e das companhias de trânsito em estar fazendo isso."
A CET, como a própria assessoria do órgão relatou, não possui nenhum projeto que prevê a ampliação das botoeiras sonoras na capital paulista. No começo do ano, a Prefeitura de São Paulo lançou uma licitação com o custo de R$ 100 milhões para a manutenção e substituição da rede de semáforos da cidade, mas sem incluir qualquer alternativa para a travessia de deficientes visuais.
Cada botoeira sonora, segundo estimativa da Secretaria de Acessibilidade e Inclusão Social de Porto Alegre, custa em média R$ 1.200. "As substituições dos equipamentos tradicionais pelos sonoros trazem onerações, até porque não há nada barato, principalmente quando se fala em acessibilidade. Mas uma política pública tem que ser colocada à disposição da população, inclusive daquela parcela que possui deficiência visual", afirmou Cohen.
Dados do IBGE de 2010 apontam que 23,9% da população brasileira, o que equivale a 45,6 milhões de pessoas, declara ter algum tipo de deficiência. E a visual foi declarada a mais comum. Mais de 6,5 milhões de brasileiros, de acordo com o levantamento, possuem alguma deficiência visual.
"O sinal sonoro é um direito. Porque tudo que é oferecido para as pessoas que enxergam deve de alguma maneira ser equacionado para quem não enxerga", destacou o especialista em orientação e mobilidade. Para o secretário gaúcho se faz cada vez mais necessário, diante da necessidade de mobilidade desse tipo de deficiente, que antes ficava mais em casa, mas que agora luta para ter uma vida comum.
Fonte: UOL Notícias Cotidiano