Danieli Haloten chamou a atenção do público ao ser a primeira deficiente visual a atuar em uma telenovela brasileira, interpretando Anita, irmã do protagonista Malvino Salvador, na novela "Caras e Bocas", em 2009. No entanto, terminada a trama, acabou voltando para Curitiba, sua cidade natal, e se afastou da mídia.
Atualmente, quatro anos depois de conseguir a oportunidade através do autor Walcyr Carrasco, a atriz e jornalista – que tem um cão-guia chamado Higgans – segue atuando, mas em peças de teatro. Além disso, ministra palestras de motivação e inclusão pelo Brasil e dá aulas de técnica de expressão vocal. Em julho deste ano, ela ainda lançou seu primeiro livro, "Uma viagem no escuro", no qual relata infortúnios que passou durante uma viagem de intercâmbio no Canadá.
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A obra relata desde a busca de uma cidade para estudar às dificuldades pelas quais passou, como ser enviada para uma casa distante e de difícil acesso. Através da narrativa, ela dá dicas de viagem, alerta os leitores para que não caiam nas mesmas ciladas em que caiu e mostra que, mesmo sem enxergar, é possível viajar sozinha pelo mundo e se divertir. Defensora da leitura acessível, Danieli decidiu disponibilizar a obra em formato digital para que todos, inclusive deficientes visuais, possam lê-la.
“Se luto para as editoras oferecerem livros acessíveis para os leitores com deficiência visual, tenho que dar o exemplo, mostrando que é possível", explica Danieli, que critica o fato de haver tão poucas oportunidades para pessoas como ela no meio artístico : "Acredito que o mercado ainda não se tocou que somos 45,6 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência e que também queremos ser representados em comerciais e programas de TV."
EGO: "Uma viagem no escuro" é seu primeiro livro? Você sempre pensou em escrever um?
Danieli Haloten: É o primeiro. Sempre pensei em escrever um livro. Muitas pessoas diziam que eu tinha que escrever um sobre a minha vida. Mas sempre que eu começava a escrever, eram tantas histórias que eu acabava me perdendo. Quando aconteceu tudo aquilo na minha viagem ao Canadá, pensei que poderia acontecer com qualquer um, e as pessoas precisavam ser alertadas. Então, pensei que seria um ótimo tema para um livro.
O livro fala sobre a experiência frustrada que você teve durante uma viagem ao intercâmbio. O que aconteceu lá? Você viajou com seu cão-guia?
Danieli Haloten: Contratei uma agência que pertencia a brasileiros que viviam em Vancouver. Eles garantiram que eu teria toda a estrutura necessária para viver lá. Porém, ao chegar no Canadá, descobri que eu havia sido colocada em uma casa em uma cidade ainda em construção chamada Surey, no meio do mato, sem condições para uma pessoa cega se
locomover sozinha. Em vez de me realocar em um lugar acessível, a agência me abandonou. Se eu não estivesse com meu cão-guia poderia dizer que estava em
um mato sem cachorro.
O Canadá, assim como outros países desenvolvidos, é conhecido por dar um tratamento mais digno para deficientes. Apesar dos problemas que teve, você sentiu diferença?
Danieli Haloten: No meu livro desmitifico essa ilusão que muitas pessoas têm de que no exterior as coisas são melhores do que no Brasil. Falo de situações referentes à Inglaterra, Canadá e Estados Unidos.
Como estão as vendas do livro? Você está feliz com o resultado que conseguiu?
Danieli Haloten: Estou feliz com a concretização do meu livro. Principalmente porque do jeito que publiquei, todos, inclusive deficientes visuais, podem lê-lo. Também estou feliz porque escrever o livro foi uma experiência maravilhosa. Adoro escrever e seria ótimo poder viver disso.
Depois de "Caras e Bocas", você nunca mais fez um trabalho na TV. Tem feito testes e não conseguiu mais um papel ou resolveu se afastar por escolha própria?
Danieli Haloten: Não fiz nenhum teste.
Como você vê o mercado em relação a atores deficientes como você? Acha que existe preconceito?
Danieli Haloten: Acredito que o mercado ainda não se tocou que somos 45,6 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência e que também queremos ser representados em comerciais e programas de TV. Como atriz, o que posso dizer é que não preciso fazer necessariamente personagens com deficiência visual. Mesmo que eu fizesse somente papel de deficiente visual, há uma infinidade de personagens que eu posso fazer sem necessariamente abordar os problemas da deficiência. Eu poderia ser uma Paloma, uma Leila da vida, porém, com uma deficiência visual. E mesmo que me deem papéis de cega estereotipada para fazer, o que é que tem? Não tem um monte de ator que faz sempre o mesmo papel? Quanto a meu trabalho como jornalista, não faço somente matérias sobre pessoas com deficiência. Mas admito que as empresas de comunicação precisariam ter uma profissional especializada como eu, porque a mídia vive veiculando matérias sobre pessoas com deficiência que, ou são errôneas, ou não abordam o tema adequadamente, demonstrando despreparo. E para esclarecer, não me tornei especialista por ter uma deficiência, mas porque estudei sobre o assunto.
O que você tem feito? Continua trabalhando como atriz em Curitiba?
Danieli Haloten: Depois da novela, fiz um stand-up e, este ano, fiz uma gaúcha no Festival de Curitiba. A peça se chamava “A farsa do bom marido” e minha personagem enxergava perfeitamente. Continuo ministrando palestras de motivação e inclusão pelo Brasil, dando aulas de técnica de expressão vocal para comunicadores, atores e para quem tem problemas de comunicação oral e publiquei um artigo na revista americana Matilda Ziegler.
Quais são seus objetivos no momento?
Danieli Haloten: Quero continuar dando minhas palestras e meus treinamentos e ainda gostaria de trabalhar como apresentadora de TV em um de meus projetos.